O Mestre Relojoeiro e a Casa de Seu Pedro Oliveira

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Fernando Oliveira (jornalista)

 

O sol escaldante das 13h me fazia apressar o passo na subida do Beco da Pacotilha em direção à Praça João Lisboa à procura de alguma sombra que aplacasse o calor abrasador daquele início de tarde. Já quase na esquina com a Magalhães de Almeida, um casarão com pintura nova, recém-reformado, chamou minha atenção. Antes que procurasse saber o que nele funcionava, no térreo, em uma pequena sala, deparei-me com um relojoeiro em plena atividade. A curiosidade me impeliu a entrar, sob o pretexto de ser um cliente em busca de serviços.

 

Observei atentamente o espaço: um monte de peças espalhadas sobre a mesa, as paredes repletas de relógios de todos os tipos. Um relógio em particular evocava memórias da residência do meu avô, Pedro Oliveira. Lembro-me bem do som de suas badaladas, ficava na parede, acima da cabeceira da mesa onde ele fazia as refeições com minha avó, dona Maroca, alguns netos, meus irmãos.

 

O artesão, imerso em sua arte, mal notou minha chegada e continuou concentrado em seus afazeres. Cumprimentei-o com “boa tarde!”. Ele afastou sua lupa, levantou a cabeça e me acolheu com cordialidade.

 

Com sua permissão, capturei a essência de sua oficina em fotografias, enquanto o inquiria sobre sua vida entre os tic-tacs. É um homem  de 56 anos e, desde os 13, passa os dias ajustando ponteiros, recuperando engrenagens de relógios, os mais variados: de parede, de mesa, de pulso. Perguntei se tinha algum de bolso. Abriu a gaveta e tirou um prateado, aguardando a peça para o conserto. Não é tão antigo quanto parece. É dos anos 70, assegurou, após abrir a máquina com uma chave minúscula. É desse modo que identifica o ano de fabricação. O mais antigo que restaurou é de 1883, um relógio de parede da marca americana Ansonia.

 

Cliente não falta para o relojoeiro. Foi assim, trabalhando sem contar as horas, de segunda a sábado, que criou o casal de filhos, um de 30 anos e outro de 23, ambos quase formados, ela em farmácia e ele em biblioteconomia, como faz questão de frisar com certo orgulho. Despedi-me do relojoeiro e segui meu caminho, já quase refeito da exposição ao sol que me fez parar naquele lugar, uma espécie de laboratório do tempo, e voltar ao passado.

 

Em minhas andanças pelo Centro Histórico de São Luís (Brasil), já encontrei outros profissionais, como barbeiros e alfaiates, que se mantêm em atividade há décadas, indiferentes ao processo de gourmetização pelo qual esses ofícios passaram nos últimos anos. Qualquer hora dessas, sou capaz de dar uma paradinha por lá para escapar do calor que tem se abatido sobre nossas cabeças. Quem sabe, com uma boa conversa, descubra outra história interessante para contar. Ou encontre algum objeto que faça lembrar a casa de seu Pedro Oliveira.

 

 

 

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